Por Mayumi Kitamura
Um grupo de pesquisa em biologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) identificou a presença de mercúrio, chumbo, cobre e cádmio, ou seja, metais pesados, em amostras coletadas em três áreas de manguezal no rio Itapanhaú. Monitoramento regular feito pela Cetesb confirma a presença de três dos metais pesados constatados pela pesquisa. A ingestão destes materiais em altas concentrações, tanto pela água quanto por animais contaminados, pode causar problemas neurológicos e desenvolver cânceres.
O levantamento sobre metais pesados abrangeu não somente Bertioga, mas também áreas de manguezal em Iguape, Cananeia, Peruíbe, São Vicente e Cubatão, conforme contou o professor da universidade do campus Litoral Paulista e coordenador da pesquisa, Marcelo Pinheiro. O projeto iniciou em 2009, e as pesquisas foram conduzidas de 2010 a 2012. O grupo de pesquisa em biologia de crustáceos, denominado Crusta, teve como objetivo identificar a presença deste tipo de material tanto em caranguejos-uçá recolhidos nas localidades quanto em seu habitat e vegetação.
Os pesquisadores recolheram amostras da água e do sedimento em três trechos e, na água, foi constatada a presença de cobre em um dos trechos e chumbo em todas as áreas do levantamento. Já as amostras de sedimento indicam contaminação por mercúrio em dois trechos e cádmio em três.
Marcelo explica: “Nós considerávamos que Bertioga, por causa da beleza paisagística, seria um local prístino, ou seja, sem poluentes. Mas não foi isso que nós encontramos”. De acordo com o estudo, os níveis de contaminação ambiental em Bertioga ficaram acima dos de Cubatão, que apresentou a presença de chumbo, cádmio e mercúrio, diferindo de Bertioga na constatação de cobre. O relatório da pesquisa aponta o caranguejo-uçá como uma ferramenta no monitoramento de áreas de manguezal e estuarinas, indicando com precisão o estado de conservação ambiental. Quando há histórico de contaminação, como em Cubatão, tanto a flora quanto a fauna sofrem consequências. Em manguezais estudados durante a pesquisa, o grupo encontrou espécimes com malformação em sua estrutura corporal, como nas pinças, abdômen ou carapaça. Segundo o professor, as malformações são comuns, contudo, têm incidência 3% superior nestas áreas.
Para o biólogo, “é um problema muito grave, até de saúde pública, eu diria, porque o principal nível de contaminação adquire-se através da água. Então, por exemplo, os peixes e outros animais aquáticos, e inclusive o homem, em contato com a água, pode ter uma contaminação por estes poluentes. Em contato com o sedimento, no caso dos catadores de caranguejos, isso é uma realidade”. Ele detalhou que, mesmo a ingestão dos animais que vivem no local poluído, pode contaminar o ser humano.
Os parâmetros utilizados para mensurar a contaminação sobre cada metal na água são indicados pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama nº 357/2008) e, no sedimento, por uma organização canadense, a Environmental Canada.
Procurada, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) afirmou que desde 2001 realiza bimestralmente o monitoramento das águas do rio Itapanhaú, em Bertioga. A partir de 2011, as amostras apontaram uma “pequena porcentagem de resultados não conformes”, em torno de 10%, para cobre, chumbo e cádmio, contudo, não indicaram a presença de mercúrio na água salobra. “Em outras palavras, desconformidade do padrão de qualidade quer dizer, na linguagem dos especialistas, que os dados ultrapassaram o padrão de qualidade estabelecido pela legislação. Segundo ainda os especialistas, não há, no caso do rio Itapanhaú, indícios de que haja um problema sistemático de metais pesados. Tratam-se, ainda, de dados indicativos e, portanto, a medida mais adequada é prosseguir com o trabalho de monitoramento para acompanhar a tendência nas próximas coletas”, informou . Possível origem
Para o grupo de pesquisa, a principal origem dos metais pesados encontrados nas amostras coletadas é oriunda do lixão de Bertioga, desativado em 2001. Marcelo Pinheiro acredita que a área antigamente utilizada esteja vazando chorume, material rico em metais, conforme estudos.
Por meio de nota, a prefeitura de Bertioga afirmou que medidas de controle foram aplicadas no lixão, como cobertura e instalação de drenos para gases. Ainda, em 2014, teria realizado uma investigação sobre a contaminação do solo, subsolo e água subterrânea e, em nenhum deles, teria sido indicada a presença de contaminação. Tanto o laudo quanto o relatório foram encaminhados à Cetesb. Para a secretária de Meio Ambiente de Bertioga Marisa Roitman, “é impreciso correlacionar a contaminação de caranguejos, por exemplo, ao antigo lixão de Bertioga, que funcionou por um curto período de tempo. Isto porque, o sistema estuarino da Baixada Santista é interligado, sendo que a contaminação pode vir do polo industrial de Cubatão ou do porto de Santos, por exemplo”.
A possibilidade apontada pela prefeitura de que metais pesados sejam provenientes de Cubatão é descartada pelo coordenador da pesquisa. “Nós acreditamos que isto não possa ocorrer em função do próprio fluxo hídrico, que é de cada um desses rios em relação à foz. Certamente, no momento de maré alta nós teríamos um empacotamento de ondas e uma dispersão maior, mas teríamos mesmo assim o fluxo vindo do rio Itapanhaú em relação à foz. Pela grande contaminação que nós vimos na água, podemos falar que essa contaminação é de fonte poluente que está ali, no rio Itapanhaú, com certeza. Então a única origem de poluição seria justamente decorrente deste lixão”, apontou.
Segundo informado pela prefeitura, há um processo protocolado na Cetesb para a recuperação da área do antigo lixão, “uma vez que não há resultado sobre contaminação química e o órgão estatal deverá apresentar as medidas de recuperação da área. Não havendo contaminação química, o resíduo fica enclausurado, sofrendo degradação natural. No futuro, a área poderá ser restabelecida, quando os gases forem exauridos para a atmosfera”.
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