DENÚNCIA

Mãe e filho são vítimas de racismo em escola de Santos

Menino é xingado de macaco por colega e de projeto de bandido por madrasta dela em escola de Santos; “Ninguém fez nada e agora meu filho tem medo de sair na rua”

Thiago S. Paulo
Publicado em 17/10/2023, às 13h57

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UME Professor Walvery de Almeida, onde caso aconteceu e Nayara e o filho - Imagem: Divulgação / Prefeitura de Santos / Acervo Pessoa - Nayara Alves
UME Professor Walvery de Almeida, onde caso aconteceu e Nayara e o filho - Imagem: Divulgação / Prefeitura de Santos / Acervo Pessoa - Nayara Alves

Nayara Alves, uma técnica de enfermagem de 37 anos afirma que ela e o filho de 9 anos, ambos negros, foram vítimas de racismo dentro de UME Professor Waldery de Almeida, uma escola municipal a cerca de 5 km da região central de Santos, no litoral de SP.

Em entrevista ao Portal Costa Norte nesta terça-feira (17), ela afirma que o caso vinha se arrastando há meses e atingiu colorações dramáticas no início do mês, em pleno pátio da escola.

Na ocasião, relata Nayara, uma mulher que se identificou como madrasta de uma colega de classe do filho - uma menina branca que vinha xingando o menino de macaco e mandando ele comer banana - os abordou no meio da unidade de ensino e, por dez minutos, proferiu contra Nayara e o filho uma série de impropérios racistas sem nenhuma intervenção de nenhum funcionário da escola.

“Uma mulher loira, de olhos azuis. Ela começou a chamar a gente de bandido, de projeto de marginal, de delinquente. Ela gritava pra mim ‘você está criando um projeto de bandido, um delinquente, um burro.' Meu filho presenciou tudo”, lamenta Nayara, que prossegue.

O que me deixa revoltada é que, naquele momento, o relógio atravessava meio-dia e meia, havia crianças entrando e saindo da escola, havia pais, inspetores de alunos, o pessoal do administrativo, o pessoal da higienização, o corpo docente e ninguém, absolutamente ninguém, interferiu. Ninguém resguardou a integridade do meu filho. Eu não vou nem falar a minha, eu vou falar a dele, uma criança”.

O que aconteceu

Nayara afirma que o caso começou há meses, quando o filho começou manifestar desinteresse por frequentar a escola e, questionado por ela, contou que há cerca de um ano vinha sendo chamado de macaco e sofrendo outras injúrias raciais por parte de uma colega de sala.

“Sempre tentei ensinar pra ele a ter orgulho de ser negro. Mas de um tempo pra cá ele começou a me perguntar ‘Mãe, eu sou sujo? Mãe, ela [colega] mandou eu comer banana; Mãe, por que o meu cabelo é duro?’ as agressões vinham de uma menina em específico”, explica a técnica de enfermagem. 

Nayara afirma que, à época, procurou a direção da escola e ouviu de uma coordenadora pedagógica que aquilo era “uma coisa de criança” e diz que questionou: “Não, isso não é coisa de criança, isso é preconceito”.

Ela relata que, no início do mês, após o filho ter reagido aos insultos racistas, foi à escola buscá-lo e se deparou com uma advertência ao menino exposta publicamente. “Eu fui buscar meu filho como em um dia qualquer e normal. Na porta da sala de aula, porque lá a gente sobe até a porta da sala de aula para buscar a criança, a professora falou para mim que havia uma ocorrência para eu assinar”.

Ela afirma que, em seguida, foi questionar uma vice-diretora, mas, antes disso, foi abordada pela mulher que se identificou como madrasta da colega de sala do filho. Nayara avalia que o comportamento da mulher explica porque a enteada dela tem agredido seu filho na sala de aula. “Crianças não nascem racistas. Acredito que essa menina está reproduzindo o que ela ouve na casa dela".

A profissional da saúde conta que, além de nenhum funcionário da escola ter interrompido as agressões contra ela e o filho, ainda dispensaram uma viatura acionada por ela. 

No dia seguinte às agressões, Nayara transferiu o filho para outra escola e registrou queixa no Conselho Tutelar da Zona Noroeste santista. Ela também abriu um boletim de ocorrência de injúria racial no 5º Distrito Policial de Santos.

Na avaliação da técnica de enfermagem, a escola não protegeu a integridade psicológica de seu filho, submeteu ela e a criança à situação vexatória ao expor publicamente a advertência e falhou em reprimir as ofensas racistas que o menino vinha sofrendo da colega. 

O sentimento que eu tenho é de tristeza, de indignação. Agora meu filho tem medo de sair na rua. Ele tem medo dessa mulher pegar a gente. Ele me fala isso chorando todos os dias”, revela Nayara. Ela afirma que pretende judicializar o caso.

Procurada, a prefeitura de Santos disse que a supervisão de ensino da secretaria de Educação (Seduc) está apurando as denúncias e acompanhando o caso. O órgão, acrescentou a administração santista, vai orientar a equipe gestora da escola sobre os procedimentos que devem ser tomados em relação aos estudantes.

“A Seduc”, concluiu a prefeitura, “repudia qualquer ato de racismo e injúria racial e  desenvolve um trabalho de conscientização na rede municipal de educação, por meio de palestras e visitas às unidades de educação, para que questões raciais sejam temas de discussões e reflexões, atendendo a lei federal”.

A reportagem ainda não conseguiu identificar a mulher acusada de agredir Nayara e o filho e segue acompanhando o caso.

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