LITERATURA

Autora de Bertioga concorre à premiação literária

Em "Os Amores de Clara" Simone O. Marques homenageia mulheres que lutaram por seus direitos no Brasil do século 20; livro concorre ao Prêmio Kindle

Rebeca Freitas
Publicado em 20/10/2023, às 08h42

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Simone afirma que leitores bertioguenses são público fiel de sua obra - Divulgação
Simone afirma que leitores bertioguenses são público fiel de sua obra - Divulgação

Simone O. Marques veio para Bertioga durante a pandemia de covid-19 no intuito de passar alguns dias e nunca mais foi embora do litoral. Em Os Amores de Clara, a escritora homenageia todas as mulheres que lutaram por uma sociedade mais igualitária no Brasil do século 20. Inspirada nas memórias da tia-bisavó, a autora também reconhece a luta dos imigrantes portugueses que vieram ao país com a promessa de melhores condições de vida, porém enfrentaram circunstâncias precárias de trabalho. Ela está concorrendo pela primeira vez ao Prêmio Kindle de Literatura

A obra mais recente da autora foi publicada no fim de julho e até então se restringe ao formato de e-book, requisito para concorrer ao concurso cultural que está em sua oitava edição e reconhece os melhores romances originais brasileiros. O concurso premia com R$ 50 mil, além viabilizar o livro nas versões impressa e em audiobook.  “É a primeira vez que estou concorrendo porque costumo escrever séries e a premiação só aceita livro único. Os Amores de Clara atendia a todas as exigências do Kindle e resolvi tentar pela primeira vez”, declara Simone. 

Sobre o livro

capa de livro
Capa digital do livro lançado em julho - Divulgação 

No enredo, Clara e a família se mudam de Portugal para o interior de São Paulo, com a crença de que teriam boas oportunidades de emprego na região. Quando chegam, descobrem estar em uma servidão por dívidas e precisam quitar o valor imposto pelo fazendeiro. Presa a esta realidade, mas ainda sem idade para entender a situação, a protagonista trava batalhas individuais ao sonhar em estudar.

A inspiração para a obra mescla a história de várias mulheres da árvore genealógica de Simone. Ela trouxe referências de suas avós, sua sogra e principalmente de sua tia-bisavó. “Eu digo que a Clara é uma colcha de todas essas experiências de mulheres que eu tive na minha vida, com todas as histórias que elas sempre contaram”, expõe Simone. 

“No livro, coloco um olhar não só para minha história familiar, mas para os imigrantes que chegaram ao Brasil no final do século 19 e início do século 20,  para trabalhar em fazenda de café e passaram muitas dificuldades. Eles vieram para cá com a promessa de conseguir terras, mas muitos deles não conseguiram conquistar nada, pelo contrário, estavam sempre com dívidas”, compartilha a autora, que está em sua 34ª obra em 16 anos de carreira. 

Na história, os pais da protagonista acreditam que a garota deve cuidar do lar para se tornar uma esposa ideal, mas a paixão do irmão Romeu por histórias a inspira na busca por conhecimento. Teimosa, ela começa a assistir às aulas destinadas somente a meninos no telhado da escola. Todos os dias, entra na instituição com a ajuda do amigo Pedro e sobe até o topo do edifício para acompanhar as lições de longe e descobrir como formar palavras.

A autora revela que o título faz referência a uma tríade de afetos da personagem principal. “São esses os amores: o amor pelo conhecimento; o amor pela família, representado através do irmão Romeu e também o amor juvenil, que é o amor pelo Pedro”, menciona.

Na narrativa, a personagem recorda as próprias memórias através de uma perspectiva madura. Ao falar sobre o passado já na fase adulta, ela evidencia a inocência da infância, as desigualdades de gênero e os problemas financeiros da família na época - que antes passavam despercebidos sob o olhar da juventude. “Escrevi para sensibilizar sobre a questão da educação, principalmente na área rural, que ainda é muito difícil. Por mais que tenham escolas nas fazendas, a dificuldade de ir ainda é muito grande. A educação está lá, mas ela não atende à necessidade do público na área rural”, critica.

Com uma linguagem simples, a obra percorre três décadas da trajetória da protagonista, até 1932, ano em que as mulheres conquistaram o direito ao voto no Brasil. "A voz de Clara é parte das vozes de muitas mulheres que foram caladas por tanto tempo”, destaca. 

Segundo Simone, o processo criativo para escrever Os Amores de Clara envolveu uma pesquisa aprofundada sobre as origens de sua família. “Em 1970 minha tia-bisavó escreveu um livro independente no qual ela contava toda a história de como aprendeu a ler e escrever de cima do telhado da escola. Essa história sempre me agulhou e eu comecei a pesquisar mais sobre migração, porque minha família toda veio de Portugal. Então fui pesquisar tudo, como era a vida das famílias em Portugal, como era o processo da vinda para o Brasil. Depois dessa pesquisa, para escrever o livro, demorei um mês”, relata a afiada escritora ao Portal Costa Norte

“Minha tia que inspirou a história se chamava Clotilde, só que o nome que a gente conheceu dela era Leonilda. Porque quando eles vieram para o Brasil, os pais perderam os documentos dela e ela teve que pegar os de uma irmã que morreu. Tornei a história mais suave e delicada, porque a história dela original é muito dramática”, revela a autora. 

A imigrante lutou muito. “Até ela morrer, minha tia-bisavó carregou uma amargura pela escola nunca ter aberto as portas para ela. Ela queria muito ser professora, mas não conseguiu, ao contrário da Clara que consegue”, conta Simone. 

Quando se trata da luta das mulheres, a escritora acredita que ainda há muito o que galgar contra a desigualdade de gênero. “Legalmente, temos o direito à educação, mas ainda existem muitas barreiras, ainda se exige que a mulher cuide da casa. Hoje temos instrumentos melhores para lutar que a Clara não tinha. Ela tinha limites sociais de até onde poderia ir. Hoje conseguimos superar muitas barreiras nesse sentido, conseguimos ir mais longe, mas existem dificuldades”, coloca Simone.

Sobre a autora

Pedagoga de formação, Simone O. Marques deixou as salas de aula na universidade em que lecionava para dedicar-se totalmente à escrita há 16 anos. Sua carreira de escritora começou por conta de um sonho diferente que teve e, a partir dele, originou uma série de livros. Hoje ela tem 34 obras literárias. Destes, 28 estão disponíveis ao público. “Eu não pensava em carreira literária. A coisa mais longa que eu havia escrito até então tinha sido minha dissertação de mestrado. Mas fazer essa transição para mim foi tão bom e tão natural, que hoje realmente sei que é isso que quero fazer”, afirma. 

Todas as obras anteriores da escritora foram publicadas em versões físicas “Tenho séries de fantasia; de romance histórico, contemporâneo e de época e tenho distopia. Além disso, escrevi um livro infantil”, enumera.  

Sobre projetos futuros, ela está elaborando um spin-off de uma série sobre vampiros, além disso, escreve mais um romance de época, categoria que representa as melhores vendas da autora. A autora também tem seu próprio selo editorial, o Som Books, por onde publicou obras e sagas como As Filhas de Dana, Os Amores de Clara, Triskle e Sabores de Sangue.

Rebeca Freitas

Rebeca Freitas

Formada pelo Centro Universitário Adventista de São Paulo (Unasp)

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