Apesar de seu nome remeter ao interior do país, a caipirinha nasceu em Santos; veja curiosidades sobre uma das bebidas mais famosas do Brasil
Esther Zancan
Publicado em 29/01/2025, às 07h59 - Atualizado às 09h04
Sabia que a caipirinha, brasileiríssimo drinque à base de limão, gelo e cachaça, apesar de o nome remeter ao interior do país, é santista de ‘nascimento’? A publicação A Terra da Caipirinha - Como a caipirinha nasceu, foi batizada e cresceu em Santos, do profissional de comunicação e marketing Marco Antonio Batan, com o apoio da Fundação Arquivo e Memória de Santos, explica esta história.
A publicação destaca a confusão muito comum entre a caipirinha e a batida de limão, esta, feita com o suco do limão. Já a caipirinha leva limão cortado em pedaços e macerado no copo, mais açúcar, aguardente de cana e gelo. E, dois dos ingredientes da caipirinha - o limão e o gelo - dão uma pista de quando o drinque foi realmente criado.
Até o fim da década de 1920, o limão, por incrível que pareça, era um fruto raro no Brasil. Ele só começa a ser mais amplamente conhecido quando passa a ser usado como remédio contra a gripe espanhola. Já o gelo se tornou mais utilizado em meados da década de 1950, com a chegada dos refrigeradores elétricos. Portanto, acredita-se que o surgimento da caipirinha deve ter ocorrido no fim da década de 1950.
Outra curiosidade é que, até a década de 1970, o limão utilizado na caipirinha era o galego, de casca fina, que não precisava ser retirada antes de a fruta ser macerada no copo. Na década de 1970, uma praga dizimou as plantações de limão galego e, a partir de então, cresceu o consumo do limão taiti, de casca mais grossa, utilizado até hoje.
Agora, quando o assunto é a cachaça, é aí que Santos começa a entrar na história. Os entendidos no assunto caipirinha sabem que, para elaborar o drinque, uma pinga artesanal não é a mais indicada. O aroma da madeira em cujo tonel a bebida foi envelhecida interfere no gosto da caipirinha. O ideal é utilizar a cachaça mais forte, para ser diluída com o gelo. Logo, a cachaça industrializada é melhor do que a pinga artesanal, neste caso.
Ainda de acordo com a publicação, é exatamente por esse detalhe que dá para dizer que a caipirinha nasceu em Santos. Há de se lembrar que o primeiro engenho de cana de açúcar do Brasil foi erguido em Santos, o Engenho dos Erasmos, em 1530, no sopé do morro da Nova Cintra. Na metade do século 20, havia, no mesmo local, diversos alambiques e plantação de cana de açúcar.
Na década de 1950, existia a pinga artesanal Morrão, produzida no morro da Nova Cintra, de excelente qualidade. Entretanto, a cachaça industrializada, feita na região de Piracicaba, no interior paulista, era chamada pelos caiçaras de pinga caipira, para se diferenciar daquela do Morrão, nobre demais para ser misturada com gelo e limão. Caipirinha foi o nome dado à mistura da cachaça produzida no interior, a “cachaça caipira”, com gelo e limão.
No final dos anos 1950 e início dos anos 1960, Santos era um local perfeito para o surgimento do que fosse diferente, inovador. A caipirinha, apesar de sua origem popular, trazia consigo uma boa dose de brasilidade, e logo virou moda. Era possível encontrar a bebida em locais dos mais refinados, como o icônico Parque Balneário Hotel, até em barracas de praias e botequins. A mistura de Sol, praia e relaxamento foi mais um estímulo para sua popularização.
O autor da publicação também dá um exemplo que prova que a caipirinha nasceu mesmo em Santos, e não no interior de São Paulo, como muitos acreditam. Em 1975, um amigo, acompanhado de outros colegas santistas, foi convidado para uma confraternização universitária em Piracicaba. No caminho para o interior, o grupo parou em um bar na beira da estrada e pediu uma caipirinha no balcão. A reação do atendente foi violenta, pois este pensou se tratar de uma ofensa às moças locais.
Para Batan, o caso prova que o nome caipirinha não nasceu no interior de São Paulo, pois era considerado até um termo ofensivo por lá. O nome só poderia ter surgido no litoral, onde é comum chamar quem é do interior de “caipira”, do mesmo modo que o pessoal do interior chama quem é do litoral de “caiçara”.
O autor lembra também que, até meados de 1975, a caipirinha já era amplamente conhecida no litoral paulista, pelo menos entre Praia Grande e São Sebastião, mas não muito fora desse eixo. Nessa época, uma propaganda do rum Bacardí torna a caipirinha mais conhecida em todo o Brasil e também melhor aceita socialmente. Na propaganda, a Bacardí lançava a “caipiríssima”, uma versão com rum, no lugar da cachaça. Mais tarde, veio a “caipiroska”, com vodca, até que, ao sabor das ondas dos modismos, volta à cachaça, em uma ode à brasilidade e até devido à preferência dos “gringos”.
Outro detalhe que não passa despercebido pelo autor é que a própria cachaça “nasceu e foi batizada” em Santos, pelo fato de o primeiro engenho de cana do Brasil ter sido construído na cidade. Acredita-se que a aguardente de cana era adicionada a suco de frutas ainda no tempo da escravidão. O livro A Terra da Caipirinha - Como a caipirinha nasceu, foi batizada e cresceu em Santos, pertence ao acervo da Fundação Arquivo e Memória de Santos.
Esther Zancan
Formada pela Universidade Santa Cecília, Santos (SP). Possui experiência como redatora em diversas mídias e em assessoria de imprensa.