Apesar da recente descoberta, planta já entrou para a lista vermelha de espécies ameaçadas, da União Internacional para a Conservação da Natureza
Conhecido por suas belezas naturais, pela prática de mergulho e considerado o maior ninhal de aves marinhas do Sudeste brasileiro, o Arquipélago dos Alcatrazes, localizado a 33km da costa de São Sebastião, no litoral norte paulista, agora revela possuir mais uma espécie endêmica, ou seja, que existe apenas naquele local. Trata-se de uma nova espécie de bromélia, identificada por pesquisadores brasileiros, batizada com o nome científico de Tillandsia uiraretama.
Bromélias são encontradas facilmente na região. Especialmente na Serra do Mar, em trilhas que circundam as praias e em manguezais, mas com raízes que dependem do solo ou árvores para se desenvolverem. No entanto, as identificadas em Alcatrazes são rupícolas (ou rupestres), que se desenvolvem em superfícies rochosas, sem solo, como é o caso de Alcatrazes, batizada pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) como Refúgio de Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes.
De acordo com o instituto, o estudo foi conduzido pelos pesquisadores Gabriel Pavan Sabino, Marcio de Melo Leodegario, Gabriel Mendes Marcusso, Nathan Miranda Gazineu David, Ingrid Koch, Danilo Ulbrich Tavares e Fábio Pinheiro, que destacaram a relevância da espécie para a compreensão e preservação de unidades de conservação
A descoberta ocorreu durante trabalho de campo em um afloramento granítico insular no Sudeste do Brasil. O táxon (grupo que compartilha características comuns) proposto pertence ao subgênero T. Anoplophytum. De acordo com os pesquisadores, as bromélias medem entre 4cm a 7,5cm de comprimento e produzem entre oito a 16 flores por inflorescência, com pétalas lilás.
Segundo o ICMBio, Alcatrazes abriga mais de 1,3 mil espécies, mas, ao menos 100 delas, estão ameaçadas de extinção. O arquipélago, ainda segundo o instituto, é um importante local de alimentação, reprodução e descanso para mais de 10 mil aves marinhas.
O biólogo Gabriel Pavan Sabino explica que, em ilhas, os organismos ficam isolados do continente, o que favorece o processo evolutivo que diferencia as espécies. "Costumamos brincar que a ilha dos Alcatrazes é uma 'ilha de uma ilha', pois, mesmo durante os períodos glaciais, quando houve conectividade terrestre com o continente, há cerca de 15 mil anos, o ambiente rochoso de Alcatrazes era tão distinto do entorno que, ainda assim, havia isolamento entre as espécies que ali viviam".
Segundo ele, “essas características ambientais únicas de Alcatrazes reforçam ainda mais o isolamento. Certamente, ainda há espécies desconhecidas pela ciência esperando para serem estudadas, com potencial de contribuir para os mais diversos ramos do conhecimento científico.”
O nome 'uiraretama' foi escolhido para a espécie por ser a forma 'latinizada' de wyrá r-etá-ma, ou 'local das aves'. Essa era a denominação dada pelos tupinambás à ilha, devido às grandes colônias de aves marinhas que habitam o local. A distribuição restrita à ilha torna a Tillandsia uiraretama vulnerável às mudanças climáticas. Eventos históricos, como incêndios causados por atividades humanas e a invasão de espécies exóticas ameaçam a integridade do ecossistema local. Além disso, o aumento do nível do mar representa um risco adicional para as populações que crescem próximas à linha d’água.
Embora tenha sido descoberta recentemente, a nova espécie já recebeu o status de "vulnerável" e entrou direto na lista vermelha de espécies ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza.
A nova descoberta, curiosamente, tem forte ligação com outra espécie endêmica, a perereca-de-Alcatrazes, identificada no arquipélago em 2007, pois elas se reproduzem exclusivamente em bromélias. As fêmeas são maiores e mais pesadas que os machos, medem 28mm e chegam a pesar 1,9 grama. Os machos medem 23mm e pesam, em média, 0,9 grama. Aparentemente é a fêmea quem escolhe o macho para o acasalamento, que ocorre entre outubro e abril. O casal segue para a parte central da bromélia, onde são depositados os ovos. É na água acumulada na planta que os girinos crescem.
A espécie necessita manter a pele úmida, apesar de jamais beber água. Por isso, vivem na parte mais úmida da bromélia. Parte da respiração da perereca é feita pela pele. Se os poros do animal sofrerem ressecamento, a perereca pode morrer sufocada.