ONDA DE EXECUÇÕES NO LITORAL

Mortos a tiros com membros amarrados seguem aparecendo no litoral de SP: 14 cadáveres em 58 dias

Três mortos eram agentes ou ex-agentes de segurança, incluindo um policial civil. Em um único dia, na última sexta (19), quatro corpos, todos com marcas de tiros e alguns com mãos ou pés amarrados, foram encontrados em quatro cidades diferentes. Secretaria Estadual de Segurança Pública diz que, até o momento, não há indícios de relação entre os casos

Da redação
Publicado em 24/08/2022, às 15h07 - Atualizado às 17h17

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Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo são encontrados em Santos (SP)  Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo - Imagem: Reprodução
Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo são encontrados em Santos (SP) Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo - Imagem: Reprodução

Uma sangrenta guerra silenciosa parece estar em curso nas cidades do litoral de SP. Corpos sem vida, com características de execução, continuam  aparecendo na calada da noite ou à luz do dia sob viadutos, beiras de estradas ou ciclovias - alguns deles com cordas atadas aos pés ou às mãos, enrolados em lençóis ou sacos de lixo.

Ocorrências policiais indicam que ao menos 14 corpos com marcas de tiros foram encontrados nas cidades da região em um intervalo de 58 dias, entre 25 de junho e a última segunda (22 de agosto). Neste período, cinco corpos foram encontrados em Santos, quatro em Praia Grande, dois em Guarujá, um em Peruíbe, um em Itanhaém e um em Cubatão –  que não integra o litoral, mas compõe a Baixada Santista. 

Os últimos sete corpos foram encontrados em um intervalo de cinco dias, entre quinta (18 de agosto) e segunda passadas. Entre estas duas datas, em um único dia, na última sexta (19), quatro corpos foram encontrados em quatro cidades diferentes (veja abaixo a linha do tempo das execuções).  

Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo são encontrados em Santos (SP) Cadáveres enrolados em lençol e saco de lixo (Imagem: Reprodução)

Entre as 14 vítimas, treze eram homens com idades entre 20 e 50 anos. A única pessoa do sexo feminino entre os executados, uma mulher de 28 anos, foi encontrada também com marcas de tiro e hematomas, na última quinta, em Praia Grande.

As circunstâncias de duas mortes destoam das demais, indicam as diligências. Segundo apurou a reportagem, a sexta execução, de um homem de 31 anos há cerca de um mês e meio em Guarujá,  teria sido uma punição fora da lei pelo estupro de uma criança. A sétima execução, de um guarda civil lotado em Paulínia morto em 15 de julho em Praia Grande, é investigada como um latrocínio (roubo seguido de morte).

Comando da GCM de Paulínia foi até Praia Grande dar suporte a família do guarda municipal encontrado morto GCMs na cena do crime - Em 20 dias, sete corpos com sinais de execução são encontrados no litoral de SP Guardas em cena de crime (Imagem: Reprodução / Live Paulínia@Facebook)

Além dele, outras duas vítimas eram funcionários ou ex-funcionários da segurança pública: um ex-agente penitenciário de 53 anos, encontrado morto sob uma ponte com as maõs e pés amarrados, na última quinta (18), em Cubatão, e um policial civil, encontrado morto com uma corda atada aos seus pés e mãos em uma ciclovia de Santos na segunda (22). Ambos tinham marcas de tiros. 

A reportagem questionou a Divisão de Homicídios do DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa) e o Deinter-6 a que estão subordinadas às delegacias do litoral sobre a totalidade das execuções, mas os órgãos não se manifestaram.

Também questionada, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) disse em nota que “não há indícios de relação entre os casos”. O órgão estadual também afirmou que as investigações prosseguem e são  conduzidas pela Polícia Civil de Santos e Delegacias Especializadas - o DEIC (Departamento Estadual de Investigações Criminais) de Santos e a DIG (Delegacia de Investigações Gerais) de Praia Grande.

A SSP acrescentou que, em 2022, a 3ª Delegacia de Homicídios do DEIC “identificou 18 suspeitos relacionados a casos do tipo”, mas não especificou quantos destes suspeitos estão relacionados às 14 execuções no litoral de SP.

Sabe-se, porém, que ao menos um suspeito de envolvimento em um dos homicídios está sob custódia. Ele foi preso na última semana por guardas municipais de Praia Grande. Os agentes municipais também apreenderam um veículo que pode ter sido utilizado em uma das execuções. As informações são da gestão municipal da cidade que disse colaborar nas investigações.

As prefeituras de Santos, Guarujá, Peruíbe, Itanhaém e Cubatão também disseram que estão à disposição da polícia (veja pronunciamentos das prefeituras abaixo).

Linha do tempo das execuções

(cadáver / circunstâncias / delegacia de registro)

O primeiro corpo, de um homem de 22 anos, foi encontrado no bairro Caneleira, em Santos. Segundo a ocorrência, registrada na CPJ (Central de Polícia Judiciária) de Santos, a vítima tinha os punhos amarrados e marcas de tiros.

Uma semana depois, em 2 de julho, os corpos de dois homens foram encontrados enrolados em sacos de lixo e lençóis no bairro Jabaquara, também em Santos. Eles tinham 20 e 22 anos. Os dois casos também foram registrados na Central de Polícia Judiciária (CPJ) de Santos.

No dia seguinte, em Guarujá, o corpo de um homem de 25 anos foi avistado por caminhoneiros no km 6 da rodovia Cônego Domenico Rangoni, perto do bairro Jardim Conceiçãozinha. Os caminhoneiros avisaram policiais militares rodoviários. A vítima estava sem camisa e com diversas marcas de disparo de armas de fogo.

Dois dias depois, em 5 de julho, em Praia Grande, o corpo de um homem de 31 anos foi encontrado por moradores em um canal nas proximidades da rodovia Padre Manoel da Nóbrega no bairro Vilamar.

O homem tinha uma marca de disparo na cabeça, estava com as calças abaixadas e com os braços e pernas amarrados. A suspeita é  de que o assassinato do homem possa estar relacionado com o estupro de uma criança da região.

No dia seguinte, outro homem foi encontrado morto às margens da rodovia Cônego Domênico Rangoni em Guarujá. Além de braços e pernas amarrados, a vítima também tinha ferimentos no rosto.

Na manhã de 15 de julho, um corpo foi encontrado ao lado de um canal no bairro Anhanguera, a cerca de 10 km do centro de Praia Grande, com mais de dez marcas de tiros, segundo moradores. O homem era guarda civil municipal lotado em Paulínia, no interior do estado, e chegou a trabalhar por dois meses como GCM em Praia Grande após ser aprovado em um concurso em 2016.

Na tarde da última quinta (18), os corpos de uma mulher, não identificada,e de um homem de 28 anos foram encontrados por volta das 15h, na Avenida Diamantino Cruz Ferreira Mourão, no Jardim Melvi, em Praia Grande. A avenida é paralela à Rodovia Padre Manoel da Nóbrega, uma das principais da cidade. Uma terceira vítima, uma mulher de 29 anos, foi encontrada ferida e socorrida pelo Samu. O caso foi registrado no 3º DP de Praia Grande

Casal morto e mulher baleada teriam sido jogados de carro em movimento em avenida de Praia Grande CAPA - Casal morto e mulher baleada são jogados de carro em movimento em estrada Imagens desfocadas de corpos encontrados em avenida em Praia Grande (Imagem: Reprodução / Redes Sociais e Praiagrandemilgrau@facebook)

Na manhã de sexta, um corpo foi encontrado no km 339 Leste da rodovia Padre Manoel, em Peruíbe. Informações apontam que o cadáver estava enrolado em um cobertor e tinha duas perfurações de arma de fogo (Delegacia Sede de Peruíbe).

Na tarde do mesmo dia, o cadáver de um homem foi encontrado sob a ponte do Rio Monte Cabrão, na Rodovia Cônego Domênico Rangoni em Santos, perto da divisa com Guarujá (1º DP de Santos).

De acordo com a Polícia Militar Rodoviária, uma testemunha cuja identidade foi preservada disse que o homem chegou ao local vivo em um veículo com mais quatro pessoas. Segundo a versão da testemunha, os matadores desembarcaram a vítima, dispararam contra ela e fugiram, no sentido Guarujá.

Também na sexta (19), um ex-agente penitenciário de 53 anos foi encontrado morto debaixo de uma ponte próxima à Estrada Metalúrgico Ricardo Reis, na Ilha Caraguatá, em Cubatão (SP). Segundo informações da PM, a vítima estava com as pernas e mãos amarradas e tinha marcas de tiros.

No mesmo dia, um homem de 26 anos foi encontrado morto com um tiro no crânio em uma área de mangue, no bairro Belas Artes, em Itanhaém.

Três dias depois, na noite de segunda (22) foi registrada a décima quarta execução. O corpo de um policial civil foi encontrado perfurado por tiros e com uma corda entre as mãos e pernas em uma ciclovia, em Santos.  O corpo foi encontrado no bairro Caneleira - o mesmo onde a onda de encontro de corpos começou.

A SSP lamentou a morte do policial civil. “Policiais da 3ª Delegacia de Homicídios da Deic de Santos realizam diligências em busca de elementos que auxiliem na identificação e prisão dos autores do crime”, disse o órgão estadual.

O que dizem as prefeituras sobre as execuções

Santos

Esclarecemos que o combate e a investigação de delitos são de responsabilidade das autoridades policiais. A Guarda Civil Municipal (GCM) faz rondas diuturnas em toda a cidade e quando flagra atitudes suspeitas, os autores são apreendidos e encaminhados ao distrito policial.

A Administração também destaca que todas as imagens captadas pelas mais de 1.700 câmeras ligadas ao Centro de Controle Operacional (CCO) do município são disponibilizadas em tempo real às forças de segurança, que mantêm equipes no CCO.

Guarujá

A Prefeitura de Guarujá informa que as investigações criminais ocorrem no âmbito da Polícia Civil do Estado de São Paulo. O município de Guarujá está permanentemente à disposição das autoridades policiais estaduais para colaborar no que for preciso.

Praia Grande

A Prefeitura de Praia Grande informa, por meio da Secretaria de Assuntos de Segurança (Seasp), que a Administração Municipal colabora não apenas nas investigações policiais, como também na prevenção à criminalidade, por meio de sua Guarda Civil Municipal (GCM) e de modernos recursos como as mais de 3 mil câmeras de monitoramento e softwares como os de reconhecimento de caracteres.

Na última semana, um veículo suspeito de ter sido utilizado em um dos homicídios relatados foi identificado e apreendido pela GCM. Um homem também foi detido e o caso segue sendo investigado pela Polícia Civil. Cabe ressaltar ainda que em alguns dos casos mencionados, as vítimas não residiam na Cidade.

Peruíbe

De acordo com o secretário municipal de Defesa Social, José Romeu Dutra, a gestão municipal não participa das investigações por conta das atribuições legais da pasta. O secretário explica que o setor não tem acesso a esses boletins de ocorrência (BOs), mas que mais informações também podem ser obtidas com a Polícia Militar.

Itanhaém

A Prefeitura de Itanhaém, por meio da Secretaria de Trânsito e Segurança Municipal, contribui com as ações de segurança pública (Polícia Civil e Militar), investindo no reforço da Guarda Civil Municipal, com a convocação de novos agentes por meio de concurso público, e também através da aquisição de novas viaturas (10 viaturas adquiridas nos últimos dois anos).

Em paralelo, a Administração Municipal realizou a instalação de mais de 1000 câmeras de monitoramento em prédios públicos e vias de grande circulação, o monitoramento é realizado 24 horas pelo Centro de Operações e Inteligência (COI) da GCM. As imagens, sempre que solicitadas pelas autoridades  de polícia judiciária, são disponibilizadas para auxílio nas investigações.

Cubatão

A Secretaria Municipal de Segurança Pública e Cidadania (Seseg) de Cubatão informa que trabalha de forma integrada com as Polícias Civil e Militar, além de trocar informações gerais que possam contribuir com os diversos eventos criminosos ou ilegalidades. Vale frisar que no caso que ocorreu na Ilha Caraguatá no dia 19 de agosto não há participação da gestão municipal na investigação até o presente momento, mas a Seseg reitera que está sempre à disposição das Polícias Civil e Militar.

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