Disputa judicial por dinheiro grosso proveniente de royalties de exploração petrolífera segue semeando discórdia entre cidades do litoral norte de SP
Surpreendendo um total de zero pessoas, a decisão judicial que concedeu mais de R$ 1 bi em royalties de petróleo a São Sebastião pode não ter sido o desfecho da disputa pelo vultoso montante com Ilhabela.
Na Justiça, a cizânia se arrasta desde 2020, quando a prefeitura de Ilhabela moveu uma ação questionando uma revisão dos royalties que contemplou São Sebastião no rol de cidades com direito a acessar os recursos provenientes da exploração de petróleo na Bacia de Santos. Com isso, a soma bilionária foi bloqueada judicialmente em uma conta na Caixa Econômica Federal.
O imbróglio parecia ter chegado a uma conclusão na semana passada, quando o juiz federal Carlos Alberto Antonio Junior, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), deferiu outra ação movida pela prefeitura de São Sebastião e determinou que a Caixa Econômica Federal realizasse a transferência dos valores para a conta da cidade.
No entanto, tão logo saiu a decisão, a prefeitura de Ilhabela anunciou que iria recorrer no STJ. Rapidamente, São Sebastião também anunciou que R$ 600 milhões vão para a reconstrução de grandes áreas da cidade devastadas pelas chuvas históricas em fevereiro.
Questionada se já abriu o recurso anunciado e se vai insistir na tese, rechaçada pelo TRF-3, de que não foi plenamente consultada durante a revisão, a prefeitura de Ilhabela informou na manhã desta quinta-feira (24) que recorreu no mesmo TRF-3 e não no STJ como havia propalado.
A gestão municipal de Ilhabela também não informou se vai insistir na alegação derrotada ou se vai apresentar novas teses, mas alertou que, caso o valor por ora liberado seja gasto por São Sebastião e a Justiça determine novo bloqueio ou devolução, futuras gestões sebastianenses terão de devolver o dinheiro e se verão numa enrascada financeira.
Questionada sobre o recurso de Ilhabela, a prefeitura de São Sebastião não respondeu. A prefeitura também não informou quanto exatamente foi liberado e se a soma foi efetivamente transferida para os cofres da cidade - como tem dado a entender em anúncios de investimentos de reconstrução.
Ignorada por São Sebastião, a reportagem perguntou à Caixa Econômica Federal se o saldo de mais de R$ 1 bilhão, antes bloqueado judicialmente, já foi liberado para a prefeitura da cidade. A Caixa respondeu, ontem (23), que obedece à imposição legal de sigilo das operações de instituições financeiras e não informou o montante. Mas, segundo informações obtidas pela reportagem, o valor é de R$ 1.091.940.806,41.
Também questionada se, com a nova judicialização de Ilhabela, o valor pode ser bloqueado novamente, a Caixa disse que “cumpre as ordens judiciais que lhe são endereçadas e não comenta sobre ações judiciais em andamento, especialmente aquelas nas quais não é parte”.
Judicializada em 2020, a disputa entre São Sebastião e Ilhabela começou três anos antes, em 2017, quando a prefeitura sebastianense ajuizou uma ação administrativa na ANP (Agência Nacional do Petróleo), exigindo sua fatia dos royalties de produção de petróleo e gás natural na sua faixa litorânea. Até então, a soma era exclusiva de Ilhabela.
O pedido fez com que o IBGE, órgão tecnicamente responsável pela delimitação, revisasse suas projeções para a Bacia de Santos. Em uma nota técnica de 2020, o IBGE reconheceu que o traçado geodésico dos campos de exploração de petróleo atravessa a faixa costeira de São Sebastião, o que garantiu à cidade o direito a uma parcela dos royalties.
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