Foram implantados piquetes de madeira em um trecho de cerca de meio quilômetro, onde há maior concentração de banhistas e carros
Cansados de assistir a carros em manobras perigosas e até rachas na areia, moradores da praia de Ubatumirim, em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo, decidiram limitar o trânsito de veículos na areia da praia, criando um “corredor” exclusivo para separá-los dos banhistas, que temem atropelamentos.
Para isso, implantaram piquetes de madeira em um trecho de cerca de meio quilômetro, onde há maior concentração de banhistas e carros. A medida, porém, é ilegal, segundo a SPU (Superintendência de Patrimônio da União). A circulação e estacionamento de veículos também são vetados por lei municipal. Em um trecho da praia, uma placa fixada pela própria prefeitura informa sobre a proibição de estacionamento na praia, com um telefone para denúncias.
Mesmo assim, a prefeitura de Ubatuba autorizou a “obra” e doou as cerca de 300 estacas de madeira para que os próprios moradores criassem o “corredor”. O material, segundo a administração, estava estocado em diversos pátios da prefeitura, que seria utilizado em paisagismos de prédios públicos. O valor não foi informado.
“A medida é uma reivindicação antiga dos moradores e foi tomada em conjunto com a comunidade”, explica a prefeitura em nota.
A praia tem aproximadamente dois quilômetros de extensão. Com a medida, os veículos agora circulam pelo corredor, mais próximos à área de jundu, enquanto os banhistas permanecem em uma área mais próxima do mar, que muitas vezes diminui com a maré cheia.
De acordo com engenheiro agrônomo André Motta, do ICC (Instituto de Conservação Costeira), com a criação do “corredor”, os veículos passarão por cima da vegetação de jundu, que é rasteira. “É uma vegetação muito sensível, com poucas condições de sobrevivência, que será esmagada pelos carros, compactando a areia, o que dificultará a regeneração da espécie”, explica.
Mota acrescenta que este tipo de vegetação está situada em áreas de preservação ambiental permanente. “Além dos impactos sobre a vegetação, há também o impacto sobre os microorganismos que vivem na área, como crustáceos e eventuais ninhos de tartarugas que desovem nessa faixa de areia”.
“Pista de corrida”
Segundo os moradores e banhistas, o trânsito de carros na areia da praia é intenso aos finais de semana e se agravou com a chegada da temporada. “Já vi menores de idade dando ‘cavalo de pau’ na areia, colocando em risco a vida dos banhistas”, reclamou a turista Ana Paula Moreira Zoila, 36, que estava com seus dois filhos a poucos metros do “corredor”.
“A decisão de separar a praia em duas partes, uma para veículos, e outra para banhistas, foi tomada após a comunidade se cansar de assistir a tantos acidentes. Os moradores não são o problema, pois eles respeitam. O problema são os turistas, que fazem da praia uma pista de corrida”, justifica Juarez Barbosa, diretor da associação de moradores de Ubatumirim.
Mesmo com a medida, a reportagem flagrou no último feriado de Réveillon diversos veículos na área destinada aos banhistas. No canto direito da praia e distante do “corredor”, dezenas de carros foram vistos trafegando em alta velocidade e estacionados na área de jundu e em um rio que corta a faixa de areia.
Alguns turistas deixaram seus carros no meio da praia, como extensão às tendas fixadas na areia, e para aproveitar o som alto dos veículos. Não havia fiscalização.
Medida temporária
Os moradores afirmam que a medida é temporária e cobram da prefeitura a abertura de uma rua fora da faixa de areia e a criação de um bolsão de estacionamento da zona azul.
Em dezembro passado, a prefeitura chegou a anunciar a cobrança de estacionamento na praia - R$ 12,00 por veículo -, mas voltou atrás na decisão após desagradar os turistas. Oficialmente, a administração informou que a implantação da zona azul na praia está “em fase de adequação de estudo”.
Há apenas um acesso à praia de Ubatumirim, em uma rua de terra que começa às margens da rodovia Rio-Santos. A praia, muito procurada justamente por proporcionar aos turistas um contato direto com a natureza, praticamente intocada, está localizada na região norte de Ubatuba, a 30km do centro e a poucos quilômetros da divisa com Paraty (RJ).
Ilegalidade
A instalação dos piquetes feita pelos moradores, com autorização da prefeitura de Ubatuba, é ilegal, pois necessita de aval da SPU, órgão ligado ao recém-criado Ministério da Economia, responsável pela gestão e planejamento de territórios da costa brasileira. O órgão afirmou que não foi comunicado e que irá notificar a prefeitura, que por sua vez, informou não ter recebido a notificação.
Em nota, a SPU informou que está em tratativas com a prefeitura, por meio de um convênio de cooperação técnica, em busca de uma solução definitiva para o problema do acesso de carros na areia da praia de Ubatumirim.
Para a SPU, a iniciativa do município, em conjunto com os moradores, apesar de não ter a autorização da superintendência, é menos danosa ao meio ambiente que a grande circulação de carros no local. “Considerando que essas estruturas são removíveis, seu uso cessará tão logo sejam definidas as questões de acessibilidade à praia”, finalizou a SPU na nota.
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