Família de Ysabella Cavalcante, de Guarujá, enfrenta dívidas, desemprego e risco à saúde da criança em tratamento contra neuroblastoma avançado
A rotina da família de Ysabella Santos Cavalcante, de 9 anos, no bairro Vila Zilda, em Guarujá, no litoral de São Paulo, é marcada por lutas, superação e incertezas. Diagnosticada com um câncer raro e agressivo, o neuroblastoma grau 4, a menina precisa viajar até quatro vezes por semana à capital, para continuar o tratamento, enquanto os pais enfrentam o desemprego e a dificuldade de manter a casa.
O diagnóstico veio em novembro de 2022, depois que Ysabella caiu enquanto gravava um vídeo para o TikTok, sem que os pais soubessem. Nos dias seguintes, ela apresentou febre e vômitos persistentes. Ao ser levada para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), exames revelaram um tumor na região torácica. A doença já havia se espalhado para os ossos e a medula.
Desde então, Ysabella passa por sessões de quimioterapia, radioterapia, cirurgia e transplante de medula óssea, e é acompanhada pelo Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (Itaci), na capital paulista. Com dedicação total à filha, o pai, Gustavo Maia Cavalcante, foi demitido da marmoraria onde trabalhava. A mãe, Estefane Kerolen Domiciano Santos, também precisou encerrar o pequeno negócio on-line que mantinha para se dedicar aos cuidados da filha.
A família sobrevive com doações, bicos e campanhas nas redes sociais, pois precisa arrecadar cerca de R$ 12 mil por mês, valor necessário para cobrir alimentação especial, transporte, aluguel e medicamentos da Ysa, como é carinhosamente chamada pelos pais. "Eu, como pai, me sinto inútil, porque não consigo suprir nem tudo que ela precisa. Me sinto mal com isso. Tenho 40 anos e nunca imaginei passar por essas dificuldades com a minha filha. Hoje em dia somos sozinhos, não temos ninguém nem para desabafar", disse o pai.
Parte desse valor também é direcionado às viagens semanais a São Paulo, já que a menina não pode usar transporte público devido à baixa imunidade. Sem previsão para o fim do tratamento, a família disponibilizou uma vaquinha on-line e pede ajuda para manter a rotina de cuidados e deslocamentos. As doações podem ser feitas por meio deste link ou via Pix, chave [email protected].
O cenário ficou ainda mais crítico no dia 23 de maio, quando, ao retornarem de São Paulo, os pais encontraram a casa sem energia elétrica. A Neoenergia Elektro, concessionária responsável pelo fornecimento de energia elétrica na cidade, fez o corte por causa do acúmulo de contas atrasadas, apesar de, segundo a família, a empresa ter ciência da condição de saúde da criança.
No congelador, estavam medicamentos avaliados em cerca de R$ 50 mil, fornecidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) e essenciais para a imunidade de Ysabella. Além do risco com os medicamentos, os pais precisaram descartar alimentos comprados exclusivamente para a dieta da filha.
Temendo a perda dos remédios, o pai religou a energia por conta própria, sob orientação da advogada Victoria Fernandes Pereira, de Bertioga. Sensibilizada com a situação de extrema vulnerabilidade vivida por Ysabella e seus pais, a advogada se dispôs, de forma voluntária, a prestar assistência jurídica à família. Ela conheceu o caso por meio das redes sociais e, imediatamente, tomou as medidas cabíveis, ao ingressar com uma ação judicial contra a concessionária de energia elétrica.
No processo, a advogada aponta que o corte no fornecimento foi ilegal, uma vez que se trata de um serviço essencial, ainda mais diante da condição de saúde da criança. A ação também destaca o descaso da empresa, que, mesmo ciente da gravidade da situação, não adotou medidas para impedir a interrupção da energia.
Em entrevista à reportagem, Victoria explica que a concessionária tinha pleno conhecimento do quadro clínico de Ysabella. "A Elektro se manteve inerte mesmo com inúmeros chamados e com o pagamento das contas de luz em atraso [feito] por um seguidor que se solidarizou. Foi um completo descaso, ainda mais que a empresa tinha todos os laudos da Ysabelle, que foram entregues pessoalmente na sede meses atrás", disse a advogada.
Por meio de nota enviada à reportagem, nesta quinta-feira (29), a Neoenergia Elektro disse que se solidariza com a situação de saúde de Ysabella e afirmou que não tinha conhecimento sobre o caso. Segundo a concessionária, a cliente quitou os débitos vencidos e o fornecimento de energia foi restabelecido. "A empresa está à disposição da família para orientar na realização do cadastro de clientes que necessitam de aparelhos vitais", concluiu a nota.