INVISÍVEIS E LETAIS

Correntes de retorno estão relacionadas com 9 em cada 10 mortes por afogamento em praias

Praias do litoral paulista acumulam uma morte a cada 4 dias e mais de 2 mil salvamentos em 2023. Especialistas avaliam que população precisa ser melhor instruída sobre como evitar riscos nas areias e fora delas

Thiago S. Paulo
Publicado em 27/07/2023, às 13h50 - Atualizado às 15h29

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Maioria das mortes por afogamento em praias se relacionam com correntes de retorno capa - Correntes de retorno estão relacionadas com 9 em cada 10 mortes por afogamento em praias Vista aérea do mar com corrente de retorno - Imagem: Corrente de retorno em praia / David Szpilman / Sobrasa
Maioria das mortes por afogamento em praias se relacionam com correntes de retorno capa - Correntes de retorno estão relacionadas com 9 em cada 10 mortes por afogamento em praias Vista aérea do mar com corrente de retorno - Imagem: Corrente de retorno em praia / David Szpilman / Sobrasa

Quase imperceptíveis para quem não está habituado aos movimentos do mar, as correntes de retorno estão relacionadas com a grande maioria das mortes por afogamento nas praias brasileiras e paulistas, explicaram especialistas em entrevista ao Portal Costa Norte.

“A corrente de retorno é o local onde ocorrem 90% dos afogamentos em praias”, afirma o médico e secretário-geral da Sobrasa (Sociedade Brasileira de Salvamento Aquático) David Szpilman. “Por isso, o guarda-vidas sempre fica em frente a um banco de areia, olhando para a corrente de retorno, normalmente interditando a área”.

“Se a pessoa não estiver acostumada, se ela não tiver conhecimentos básicos do mar, não vai conseguir identificar as correntes de retorno. Então ela não consegue perceber, não é uma coisa que está nítida para uma pessoa que não é habituada”, complementa a capitã Karoline Magalhães, que comanda os subgrupamentos de Bombeiros Marítimo de Praia Grande e Mongaguá, no litoral de SP.

Contrariando a intuição, áreas de mar calmo rodeadas por ondas podem ser um indicativo da presença das correntes, explica Karoline. “A maioria das pessoas imagina o contrário. Acham que ali está tranquilo, ali que a gente tem que ficar. E não é verdade”.

Faixas costeiras rochosas são outro indicativo das perigosas correntes, acrescenta a oficial. “Você está numa praia que tem pedreiras, tem um morro de algum lado, ali vai ter uma corrente fixa que a gente chama de corrente permanente. Então, mais uma coisa pra gente falar pras pessoas: fique longe de todas as pedras”.

Foi em uma área pedregosa que banhistas viram três irmãos de 9 e 10 anos se afogando na orla de Santos e avisaram aos guardas municipais que evitaram o pior. O caso aconteceu no domingo (23), dois dias antes Dia Mundial de Prevenção ao Afogamento, decretado pela ONU em 2021 em reação a uma epidemia de mortes por afogamento, sobretudo de crianças.

Para coordenador da Sobrasa pessoas precisam entender sua competência aquática David Szpilman - Correntes de retorno estão relacionadas com 9 em cada 10 mortes por afogamento em praias Bombeiro na água (Imagem: Acervo Pessoal / David Szpilman)

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 230 mil pessoas morrem afogadas por ano no mundo. O último boletim anual da Sobrasa aponta que as mortes por afogamento passaram a ser a 1ª causa de óbito entre crianças de 1 a 4 anos a partir de 2020. Entre crianças de 5 a 9 anos, os afogamentos são a 2ª principal causa de morte.

O Brasil registra 5.700 mortes anuais por afogamento. Desse total, entre 10 e 15% se dão nas praias, explica David, que também é tenente-coronel do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro. “O número [de afogamentos nas praias brasileiras] vem caindo anualmente. Cada vez mais temos mais guarda-vidas guarnecendo as áreas de risco do nosso país. Salvamentos nem se fala. Nós temos o maior número de salvamentos em praias do mundo. Ainda assim, o número de afogamentos é enorme”.

Em 2023, uma pessoa morreu afogada a cada quatro dias, em média, no litoral paulista. Foram 49 mortes por afogamento na faixa costeira de SP do início do ano até agora. No mesmo intervalo e região, 2.169 pessoas foram salvas da morte no mar. “Efetuamos [na costa paulista] uma média de 3.500 salvamentos anualmente”, afirma a capitã Karoline.

Grande parte das mortes, ressalta David, se dão em outras áreas aquáticas. “70% das mortes por afogamento ocorrem em rios, lagos e represas, áreas sem guarda-vidas, sem supervisão e que nunca vão ter supervisão e que não tem no mundo inteiro. A gente tem um risco de 60 vezes maior em locais onde não há guarda-vidas, onde não há supervisão”.

Correntes de retorno são quase imperceptíveis para quem não está habituado, afirma capitã Karoline Magalhães - Correntes de retorno estão relacionadas com 9 em cada 10 mortes por afogamento em praias Bombeira fardada em palco (Imagem: Acervo Pessoal / capitã Karoline Magalhães)

O levantamento da OMS também indica que há correlação entre mortes por afogamento e ausência de ações de prevenção para além da presença de guarda-vidas. Segundo o índice, 9 em cada 10 mortes por afogamento se dão em países onde há menos recursos para ações preventivas.

A capitã Karoline traduz o problema para os afogamentos nas praias. “Não existe uma praia mais perigosa que a outra. Existem comportamentos de banhistas mais perigosos que outros. Então, a gente pede para as pessoas terem muita consciência de que o afogamento é um problema real”.

Para o médico, a diminuição das mortes por afogamento nas praias e fora delas passa pela disseminação de informações que permitam maior compreensão dos riscos por mais gente.

“As pessoas precisam entender sua competência aquática. Por exemplo, uma criança que sabe flutuar na piscina, colocada num rio ou praia, vai se afogar. Uma pessoa que nada muito bem, mas que é colocada em uma onda de 10 metros em Nazaré, vai morrer afogada. Então, precisa haver sempre um balanço entre o risco ambiental naquele local e a competência aquática da pessoa para enfrentar esse risco. E a única forma de disseminar isso é a educação da população para entender os riscos”.

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