2014

Caiubura e São João

Do ciclo da banana às chácaras e sítios

Da Redação
Publicado em 25/02/2019, às 13h23 - Atualizado em 26/08/2020, às 22h03

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Shin Shikuma
Shin Shikuma

Toda a região localizada logo após a ponte sobre o rio Itapanhaú, sentido Santos, compreende a área hoje denominada Caiubura e Sítio São João. Na metade do século XX, esse trecho de exuberante Mata Atlântica foi ocupado por fazendas de plantação comercial de banana, exportada, então, para Argentina. Um nome se destacou entre os anos de 1930 e 1960: José Vergara, proprietário da pródiga terra.

Imagem acervo site

As cargas de banana saíam das fazendas transportadas em troles puxados por tração animal no decauville (sistema de trilhos de ferro em via ultraestreita) e, depois, dispostas em batelões que enfeitavam o rio Itapanhaú, e seguiam, lentamente, para o porto de Santos, e, dalí, para a Argentina, principalmente. Assim, José Vergara gerou emprego para boa parte da população da época.

Imagem acervo site

O baixo preço da fruta no mercado externo resultou no declínio do ciclo da banana, o que fez os agricultores abandonar o negócio. Não valia mais a pena manter as fazendas, sobretudo as de exportação e, assim, de acordo com a neta de José Vergara, Eliana Ribeiro Vergara, a família buscou outros meios. Com o anúncio da construção da rodovia Rio-Santos, as terras limítrofes à pista foram loteadas e vendidas, originando os bairros atuais.

Caiubura

O sol brilha e reflete na mata verde resplandecente. Tudo é silêncio, como se o tempo tivesse parado. A placa indica a entrada para o bairro Caiubura e o que se vê é uma longa via de cascalho, por onde passa calmamente uma senhora solitária. Um cenário tão calmo e bucólico, que nem de longe reflete a proximidade com a rodovia Rio-Santos, por onde, diariamente, passam centenas de veículos rumo a Santos, e às badaladas praias do litoral norte.

Imagem acervo site

O último bairro de Bertioga, na divisa com a área continental de Santos, é formado por apenas dez ruas. O comércio se traduz em dois pequenos bares, e a infraestrutura pública disponível é de apenas uma escola municipal, fechada para reforma; tudo disposto logo no início da via principal, a rua 1. Tudo é mata, as chácaras escondem-se em meio à vegetação e não se vê movimento de pessoas ou de carros. A população fixa, de 200 pessoas, dobra para 400 em período de férias e feriados prolongados, segundo a Sociedade de Melhoramentos das Chácaras Caiubura.

Duas lembranças do auge do ciclo da banana ainda são mantidas no bairro, a antiga casa do capataz, logo na entrada e, na sede da entidade, na mesma via, um antigo trole. “Nesta rua, tinha os trilhos por onde os troles carregados de bananas eram puxados pela burrinha até o rio”, conta Marcelo Dias Pita, morador há 18 anos, e um dos diretores da entidade. A rua tem cerca de dois quilômetros de extensão.

Imagem acervo site

O avô de Marcelo morou no Caiubura por 42 anos, após se aposentar na Codesp; o pai seguiu o mesmo rumo, e ele manteve a história dos homens da família, mas não esperou a aposentadoria. “Eu sempre frequentei aqui e optei pela mudança após ficar desempregado. O lugar é muito bom, tranquilo. O único problema é a distância da cidade (cerca de 5km), pois tudo que precisamos só tem lá. Quem mora aqui, preferencialmente, precisa ter carro”, ressalta Marcelo. Atualmente, ele é funcionário comissionado na prefeitura de Bertioga.

Outro morador, Julio de Souza Neto, presidente da Sociedade de Melhoramentos, destaca a beleza do bairro: “Escolhi o Caiubura por sua beleza. Por poder estar 24 horas em contato com a natureza, com o ar limpo e ouvir o trinar dos pássaros a todo o instante.” Para o santista, que adquiriu moradia no Caiubura há seis anos, o bairro tem potencial para o turismo ecológico, voltado para trilhas e observação de pássaros. Ele também destaca as carências urbanas do bairro, especialmente iluminação e pavimentação de ruas.

Imagem acervo site

São João

A guarujaense Hilda Rosa Matos Riesco está em Bertioga há 36 anos e, há 12, vive no bairro São João, no loteamento conhecido como Jaguareguava, nome homônimo ao rio que passa ao fundo da área. E foi justamente o rio que a fez mudar de endereço, quando se voltou para a atividade ligada à canoagem. O filho Everdan Riesco foi precursor da prática da canoa havaiana no município, assim que a modalidade chegou ao litoral paulista. “Eu morava em Vicente de Carvalho e vim para ajudar no trabalho com as canoas”, lembra Hilda, que não se arrependeu da decisão: “Foi a melhor coisa que eu fiz na vida. Aqui conheci pessoas maravilhosas”.

Imagem acervo site

Em poucas palavras, ela define como é viver no bairro: “É excelente. Não tem nada, mas tem o sossego. É uma paz, aqui só recebo os amigos”. Mas, para desfrutar desse paraíso, são precisos alguns sacrifícios, já que o único acesso ao Centro é pela rodovia Rio-Santos. “Para viver aqui tem que ter carro”, diz Hilda.

Imagem acervo site

O alagoano Josafá Emidio Borges mora no bairro há 18 anos e não esconde a satisfação de viver nestas terras. “É maravilhoso viver aqui, pois o sossego, a paz e o contato com a natureza são constantes”. As cachoeiras e as trilhas são apontadas por ele como os principais atrativos, ainda pouco explorados, já que a região, com característica rural, é isolada e pouco conhecida. “Aqui tem muitas chácaras de veraneio. Já os moradores gostam de criar galinhas, patos e tem muitos tanques de peixes para sustento das próprias famílias”.

As dificuldades apontadas são aquelas velhas conhecidas de regiões afastadas dos centros urbanos. “Falta saúde, policiamento; não temos telefone residencial e só passam duas linhas de ônibus, a 930 (intermunicipal) e a linha 6; o preço é muito caro e os horários bagunçados”, lamenta. O comércio nessa área do Sítio João é formado por pequenas mercearias, bares e um depósito de material para construção.

Área de preservação

A área do Sítio São João, uma planície fluviomarinha compreendida entre a Serra do Mar e o canal de Bertioga, é considerada de preservação permanente, e Tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), em 1977. Por força do tombamento, toda a ocupação na área é considerada irregular e não há permissão para que a administração pública realize serviços de melhorias na região ou execute a regularização fundiária das terras. Segundo o secretário de Planejamento José Marcelo, existe “essa determinação de não fazer nada lá, não pode passar uma máquina, não pode fazer iluminação, nenhum tipo de benfeitoria pública. Estamos trabalhando neste caso e em vias de regularizar uma parte, os quinhões 8 e 9 (o bairro tem 11 quinhões). Mas estamos vendo como se resolve tudo; não pode solucionar um pedaço e deixar os outros com problemas. Mas essa é uma conversa que vai demandar um certo tempo”.

A secretária de Meio Ambiente Marisa Hoitman informou que, como parte das negociações, a prefeitura precisa apresentar ao Grupo Especial de Meio Ambiente (Gaema) um levantamento socioambiental da área, dentro do prazo de um ano (a partir de abril deste ano). “O objetivo é tentar fazer a regularização fundiária. Identificar as áreas de ocupação densa e deixar as áreas que não têm intervenção para a preservação permanente”.

Um levantamento social realizado em 2009 identificou dois núcleos de habitação subnormal no bairro. Um, na rua Perseverança, com 89 famílias, e outro, na rua Marítima, com 110 famílias. O crescimento populacional na área, segundo o estudo, é de 8% ao ano. Trata-se de áreas invadidas na última década.

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