DRAMA NA DIVISA

“Isso vai virar um tsunami”: piscinão santista está inundando favela em São Vicente, dizem moradores

Piscinão foi inaugurado recentemente sob promessa de diminuir enchentes em Santos, mas, segundo moradores da Ilha dos Bugres, na divisa com São Vicente, efeito na comunidade tem sido o inverso

Da redação
Publicado em 25/07/2023, às 12h11 - Atualizado em 27/07/2023, às 16h24

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Moradoras recorreram às mídias sociais para mostras alagamentos capa - “Isso aqui vai virar um tsunami”: piscinão de Santos está inundando favela em São Vicente, denunciam moradores Montagem com três fotos que mostram comunidade alagada - Imagem: Acervo / Patrícia de Oliveira e Aline Silva
Moradoras recorreram às mídias sociais para mostras alagamentos capa - “Isso aqui vai virar um tsunami”: piscinão de Santos está inundando favela em São Vicente, denunciam moradores Montagem com três fotos que mostram comunidade alagada - Imagem: Acervo / Patrícia de Oliveira e Aline Silva

Moradores de uma favela às margens do Rio dos Bugres na divisa entre Santos e São Vicente afirmam que estão aterrorizados por alagamentos provocados pela abertura das comportas de um piscinão inaugurado há pouco mais de um mês, no lado santista.

“Quando ligam a bomba e abrem a comporta, a minha casa enche. Eu perdi móveis, perdi a maioria das coisas que eu tinha, porque simplesmente a minha casa encheu”, lamentou a dona de casa de 39 anos Patrícia de Oliveira.

“Eles esqueceram a gente aqui. Meu sentimento é de tristeza e indignação. A gente teme pela nossa vida. Pode acontecer uma tragédia”, confessou a autônoma de 25 anos Aline Silva. Ela afirma que saiu às pressas com os filhos assim que as comportas começaram a ser abertas.

O piscinão 

Autoridades e moradores durante inauguração do piscinão, em maio “Isso aqui vai virar um tsunami”: piscinão de Santos está inundando favela em São Vicente, denunciam moradores Pessoas assistindo a água escoar de piscinão (Imagem: Divulgação / Prefeitura de Santos)

Em construção desde agosto de 2021 no final da avenida Haroldo de Camargo, no bairro Castelo, em Santos, o piscinão ou Estação Elevatória com Comportas (EEC) começou a operar em maio deste ano após uma inauguração pomposa.

“Este projeto demandou muito planejamento e investimento para sair do papel e mudar a vida de muitas famílias”, disse, na ocasião, o prefeito santista Rogério Santos (PSDB). “Esta obra é mais que uma estação elevatória, é muito mais que um piscinão”.  

A expectativa é que a estrutura composta por três bombas, uma estação elevatória, um canal e uma comporta diminua a  ocorrência de enchentes na Zona Noroeste santista. No entanto, no lado de São Vicente da favela Ilha dos Bugres, às margens do Rio dos Bugres onde o piscinão deságua, as moradoras afirmam que o efeito foi o inverso do esperado.

“Eu moro aqui há 39 anos, faço 40 em agosto. Meu pai é o segundo morador da favela”, relata Patrícia. “Até então, nunca encheu barraco. Os transtornos começaram quando começou a obra. Os barracos começaram a ceder, algumas casas de alvenaria começaram a rachar. Mas até aí tudo bem, a gente foi relevando, relevando. Só que aí inauguraram a obra, né? E começaram a ligar as comportas. Aí que acabou com a gente aqui”.

“Tem casas que estão alagadas inteiras”, explica Aline. “Meu barraco começou a ceder. Eu tenho três crianças pequenas. Então, para não arriscar a minha vida e a dos meus filhos, eu resolvi trancar a casa e ficar de favor na casa de outras pessoas, de terceiros. Tive que sair de uma coisa que era minha, para não arriscar nossa vida porque está perigoso”.

Aline e Patrícia relatam que entre 60 e 80 barracos continuam habitados na favela na área que alaga quando as comportas são abertas.

Antes da inauguração do piscinão, elas afirmam que foram procuradas por representantes de órgãos de habitação, sem saber determinar se eram de Santos ou de São Vicente. “Em algumas casas, a minha foi uma delas, o pessoal da prefeitura passou falando que iam colocar a gente no cadastro de um conjunto habitacional, que depois viria um pessoal explicar pra gente, fazer reunião, essas coisas todas. Até agora, ninguém apareceu. Ninguém”, conta Patrícia.

Desamparadas, elas duas e outros moradores têm recorrido às redes sociais para mostrar os impactos da abertura das comportas nos barracos. “A água aqui vai encher, e falta pouco. Olha a distância que falta”, se desespera Patrícia em um dos registros, enquanto a água escura escoa da comporta e cerca seu barraco enlameado. O vídeo viralizou em grupos regionais nas mídias sociais.

“A gente está de frente da comporta, está vendo?”, diz Aline noutra gravação ao mostrar uma área repleta de barracos aos pedaços rodeados pela água. “Hoje [a bomba da comporta] está desligada porque não está chovendo. Quando liga a bomba, treme tudo. E aqui é a casa da moradora que está alagando”.

O sentimento, fazem coro as duas moradoras, é de abandono. “Falaram que era pra melhorar, né? Mas na grande realidade, é só pra piorar. Deixaram a gente aí a ver navios, arriscando a nossa vida até acontecer uma tragédia. Esquecerem a gente aqui. A gente é um pessoal esquecido”, desabafa Aline.

“Eu estou indignada porque simplesmente eles podem pensar um pouquinho que são seres humanos que moram aqui. São pessoas”, protesta Patrícia.

O que dizem as prefeituras de São Vicente e Santos

Por meio de nota, a prefeitura de São Vicente disse que as secretarias de habitação das duas cidades trabalham em conjunto para remover as moradias que se encontram na faixa de escoamento da água proveniente da estação elevatória. 

“A Sehab [secretaria de Habitação de São Vicente] já solicitou nova reunião com a prefeitura de Santos para discussão do assunto, e aguarda informações da cidade vizinha sobre os estudos hidrológicos que determinarão precisamente quantas famílias devem ser removidas da área de risco”.

Questionada sobre a denúncia das moradoras e sobre o funcionamento do piscinão, a prefeitura de Santos não explicou se pretende adotar alguma providência e disse que “todo o funcionamento da EEC foi testado e aprovado” e que “o volume de água retirado é lançado gradativamente no Rio dos Bugres que abrange as cidades de Santos e São Vicente”.

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