Por Mayumi Kitamura
A proposta para o novo Plano Diretor, que estabelece diretrizes para o desenvolvimento do município, não é vista com bons olhos pela população, que aponta seu descontentamento quanto à altura permitida para prédios, e alguns aspectos ambientais. A discussão, principalmente quanto à verticalização, já foi levada às redes sociais e mobilizam os moradores, preocupados com a mudança. O documento será ainda discutido em audiências públicas, programadas para três encontros na primeira quinzena de julho, além de uma conferência e posterior encaminhamento à Câmara Municipal para apreciação.
O novo texto indica a possibilidade de construções de prédios de 100 metros de altura, de acordo com a região pretendida. A discussão sobre este tema chegou a vários grupos no Facebook, sobre a cidade, entretanto, uma das principais mobilizações é feita na página Movimento Bertioga para Todos. Um de seus representantes, o professor Ícaro Camargo, lembra que, ao contrário do novo texto, o Plano Diretor ainda em vigência não autoriza a construção de prédios em determinados locais e, muito menos, na altura pretendida: “Tal investida comprometerá a qualidade de vida como um todo. O adensamento populacional proposto é muito maior que o [bairro] da Vila Mariana, em São Paulo”. O representante do grupo aponta que o município carece de infraestrutura “pois, desde a construção dos primeiros prédios, não houve preocupação com o suporte de serviços básicos, os quais são de total responsabilidade do poder público”.
A mesma opinião é compartilhada pela fotógrafa Daniele Raible, que indica aspectos alarmantes quanto à questão: “A infraestrutura da cidade não chegou nem para a metade da população - falta água no verão e o trânsito já está dando sinais de que será mais intenso no futuro. Imagina como a poluição afetará a cidade! Quem mudou para cá, esperando ter qualidade de vida, viverá o mesmo inferno das cidades que cresceram verticalmente. Não há um ponto positivo sequer para a população de Bertioga com a verticalização”.
Um dos objetivos do Movimento Bertioga para Todos, conforme seus representantes, é levar à população não apenas discussões sobre o que está sendo proposto, mas também o que é o Plano Diretor em si. Por isso, o grupo promove reuniões todas as segundas e quintas-feiras, sempre às 17 horas, em diferentes locais. No dia 18, o encontro foi realizado próximo à praça de Esportes Radicais, no Centro e, mesmo com a chuva, cerca de 20 pessoas compareceram.
No último encontro, o arquiteto e urbanista Quirino Alves Carneiro Neto fez alguns alertas também com relação à documentação publicada: “Se nós analisarmos as atas das reuniões, não conseguiremos bater as informações com o produto final da proposta do Plano Diretor. Está no site da prefeitura, mas não sabemos qual o valor legal, porque não tem assinatura nenhuma, nem nas atas das reuniões, nem o mapa de uso do solo, nem as leis de uso do solo e código de obras e código de posturas. Como não existe assinatura, não sabemos se esta é a proposta final”.
A Associação de Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos (AEAA) também pede mudanças na revisão atual, e chegou a protocolar na prefeitura, ainda em julho do ano passado, um ofício com uma proposta diferente para o Plano Diretor. De acordo com o presidente da entidade, Douglas Bluhu, “as alterações propostas são boas, mas excedem o que o município comporta e, em alguns casos, esbarram em questões ambientais”. Para ele, o Plano Diretor vigente contribuiu para o desenvolvimento de Bertioga e não foi melhor porque não dispõe de ferramentas para aplicar tudo o que proporciona, por isso, questiona qual o plano da prefeitura para fiscalizar o que propõe a revisão do documento.
Ainda, conforme apontado por engenheiros, um dos aspectos mais alarmantes é com relação a uma das zonas passíveis de construção, a Zona Turística 2, pois engloba área de mangue, ecossistema protegido pela legislação federal. Esta falha no zoneamento foi criticada também pela AEAA, que não teve retorno, até o momento, quanto às alterações sugeridas à revisão do Plano Diretor.
Núcleo Gestor
As mudanças propostas para o Plano Diretor foram discutidas e aprovadas após mais de 40 reuniões do Núcleo Gestor, grupo formado por 18 representantes do poder público e de associações representativas. O relator do documento e diretor de Planejamento Urbano de Bertioga Roberto Costa respondeu as críticas relacionadas à altura dos prédios.
De acordo com ele, na verdade, o cálculo para as construções deve seguir não apenas a altura, mas o índice de ocupação e de aproveitamento. Desta forma, os prédios não passariam de 15 e 22 andares, se considerada a outorga onerosa: “Quando as pessoas olham a tabela, estão olhando apenas a altura do prédio e lá está escrito 80 metros, se olhar apenas este dado, é possível chegar a 27, 28 andares, supondo que cada andar tenha 2,85m. Mas não é só isso. Existem outras condicionantes para a pessoa verificar se ali pode fazer um prédio de 10, 20 ou 30 pavimentos”.
Um dos índices mais importantes a ser considerado neste caso, conforme o relator, é o de aproveitamento. O número, multiplicado pela área do terreno, indica a quantidade total de metros quadrados que podem ser construídos, incluindo a área dos pavimentos. No caso apresentado para 80 metros de altura, o índice de aproveitamento indicado pelo plano é de 5,25, com índice de ocupação de 35%. Segundo Roberto Costa, se dividido este número pela taxa de ocupação, o prédio pode chegar a apenas cinco pavimentos a mais do que o permitido pelo atual Plano Diretor: “Embora a altura, vista isoladamente, dê a impressão que poderá ser construído um prédio um pouco mais alto, na hora em que se aplicarem as outras restrições, nós vamos chegar ao número de 15 pavimentos”.
A revisão do Plano Diretor definida pelo Núcleo Gestor está disponível para consulta no site da prefeitura (www.bertioga.sp.gov.br/planodiretor), além do novo Código de Obras, da nova Lei de Uso e Ocupação do Solo e Código de Posturas. No endereço, os mapas do novo zoneamento também podem ser acessados.
Plano Diretor
O Plano Diretor é um documento que estabelece diretrizes urbanas e ambientais para o desenvolvimento do município. O texto em vigência atualmente foi aprovado em 1998, e deve ser revisto, no mínimo, a cada dez anos.
A apresentação da importância do Plano Diretor à comunidade, por meio de reuniões setorizadas, foi realizada em 2013, quando foi formado o Núcleo Gestor. Mesmo com o projeto elaborado pelo grupo, a comunidade ainda pode contribuir por meio de sugestões de melhorias do documento nas audiências públicas. Segundo a prefeitura, durante estes encontros com a comunidade, serão escolhidos os membros representantes de cada região (Central, Média e Norte), que acompanharão as audiências e deliberarão sobre o texto que passará por conferência pública e encaminhamento ao Legislativo.
Para a conferência serão eleitos delegados que terão poder de voto, sendo que para cada uma das regiões pode ser escolhido mais de um representante. Os interessados em se candidatar como representantes da sociedade e divisões territoriais devem se inscrever até o dia 1º de julho, na Casa dos Conselhos (rua Luiz Pereira de Campos, 1.117), das 9 às 17 horas. A eleição dos candidatos será feita durante as audiências.
Além dos eleitos, ainda farão parte do grupo de delegados três representantes do Executivo, três do Legislativo, dois do Governo Estadual e um do Governo Federal. Também farão parte do grupo, três membros de cada associação representativa, sendo elas Comércio, Associação dos Engenheiros, Arquitetos e Agrônomos, Ordem dos Advogados do Brasil, Associação dos Corretores de Imóveis, segmento empresarial, associação de bairros e entidades civis sem fins lucrativos. Os três últimos devem se organizar e apresentar representantes para acompanhar a conferência.
O grupo terá 15 dias para analisar as emendas, que possam ser apresentadas. Durante a conferência será votado o projeto de lei de revisão do PDDS e das leis que tratam do Código de Obras e Edificações, Lei de Uso e Ocupação do Solo e Código de Posturas.
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